sábado, 5 de fevereiro de 2011

NARCOTRÁFICO – O INIMIGO OCULTO

Publicado originalmente no Inter Relações 15 - Set/2004


 

Obra: RODRIGUES, Thiago. Política e Drogas nas Américas. São Paulo, Educ, 2004.

              O narcotráfico, fenômeno que pode ser entendido de forma simplista como sendo o comercio ilegal de drogas ilícitas interfronteiras. É usualmente apresentado pela mídia como “um inimigo sem rosto, uma força potente e difusa difícil de ser localizada e que se oculta como um animal ardiloso” (Rodrigues, 2003:11).

O grau de complexidade aumenta quando somado além da dificuldade em ser identificado conta-se também com o fator econômico e com suas ramificações nos mais diversos setores da sociedade, pois este mercado movimenta uma economia ilegal poderosa, vendendo substâncias proibidas pelas legislações em vigor e que são desejadas pelos seus consumidores.

Vale ressaltar que o narcotráfico não é um fenômeno novo, entretanto seu combate ganhou maior destaque, pois “assim como o capital, o crime tornou-se global” (Gray, 2004:90) estando presente na política interna dos países, nas economias e muitas vezes recebendo incentivos de governos que se utilizam dele como recurso para financiar atos terroristas que visam minar as bases de regimes adversários.

O tema ganhou força nas últimas décadas do século XX, pois “o vazio deixado pelo recuo do socialismo soviético seria substituído por essa nova/antiga ameaça, transmutada agora em item central da diplomacia e geopolítica dos Estados Unidos” (Rodrigues, 2004:162).

O professor Thiago Rodrigues, em seu estudo Políticas e Drogas nas Américas trabalha o emaranhado de informações que compõem o assunto e busca desvendar-lhe alguns aspectos.

A obra apresenta de forma introdutória a teoria da biopolítica esposada pelo filósofo francês Michel Foucault, na qual o Estado passa a gerir a construção de corpos sãos, com a intenção de reforçar seu poder, dispondo de mão-de-obra produtiva e efetivos para sua defesa.

Dessa forma são fornecidas as bases que possibilitam o entendimento da pressão exercida pelos Estados Unidos desde o início do século XX para a criação de leis internacionais que regulem e reprimam o uso ilícito de drogas.

Dividida em duas partes, a obra analisa as proibições nos Estados Unidos e em alguns países latino americanos e posteriormente os tráficos (produção e comercialização), bem como os aspectos da doutrina de segurança estadunidense com relação ao tema das drogas.

Na primeira parte é examinado o proibicionismo norte-americano, demonstrando a “conjunção de fatores políticos, sociais, religiosos, econômicos e morais” (Rodrigues, 2004:41) que levaram a temática das drogas para o âmbito do controle estatal, bem como o esforço de sua diplomacia em ‘exportar’ seu modelo de combate às drogas para os outros países.

Seguindo o mesmo padrão, são investigadas as normas probicionistas em alguns países latino-americanos (Argentina, Brasil, Colômbia e México), que foram eleitos seguindo o critério de que todos possuem “papéis de destaque em episódios da dinâmica do narcotráfico no século XX” (Rodrigues, 2004:36).

Na segunda parte do estudo, o autor aborda a emergência do narcotráfico como economia ilegal, desmistificando a idéia de que os grupos de tráfico colombiano reuniam-se em cartéis. O narcotráfico é assim apresentado com “uma economia clandestina dividida em dois setores” (Rodrigues, 2004:36).

Um dos setores é competitivo, responsável pelo varejo das drogas, altamente violento e o outro é o oligopólico, ocupado por empresas poderosas que controlam o refino e a distribuição da droga. Como exemplo desses setores são examinadas a organização Comando Vermelho (setor competitivo) e as empresas colombianas (setor oligopólico).

Finalmente são apresentadas as propostas norte-americanas para a militarização no combate ao narcotráfico latino-americano, identificado como o novo inimigo internacional. Conforme afirma Rodrigues, “a proibição das drogas é um instrumento eficaz para a gestão do corpo, quer seja pela prescrição daquilo que se pode ou não ingerir, quer seja pela persecução às classes perigosas que se ‘dedicam à lide’do narcotráfico” (2004:37).

Dado o enorme número de fatores contraditórios que permeiam o assunto, o estudo fornece elementos para que cada leitor teça suas próprias conclusões.

Referências Bibliográficas:

GRAY, John. Al-Qaeda e o que significa ser moderno. Rio de Janeiro, RJ, Record, 2004.
ROBINSON, Jefrey. A Globalização do Crime. Rio de Janeiro, RJ, Ediouro, 2001.
RODRIGUES, Thiago. Narcotráfico, uma guerra na guerra. São Paulo, SP. Desatino, 2003.
. Política e Drogas nas Américas. São Paulo, SP. Educ, 2004.
. Além de Insígnias e Bandeiras: Narcotráfico e as Guerras Fluxo, in MA THIAS, Meire & RODRIGUES, Thiago (orgs). Políticas e Conflitos Internacionais – Interrogações sobre o presente. Rio de Janeiro, RJ. Revan, 2004.

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