terça-feira, 16 de agosto de 2011

GLOBALIZAÇÃO, UM BREVE HISTÓRICO


"Para pensar localizadamente é preciso pensar globalmente, como para pensar globalmente é preciso pensar localizadamente" (Edgar Morin).


O termo globalização passou a ser freqüentemente empregado a partir da última década do século XX. Essa palavra, conforme afirma o professor Paulo Sérgio do Carmo serve "como a chave para explicar as mudanças por que o mundo, aí incluído o Brasil, vem passando nas últimas décadas" (1984:4).

O movimento de globalização remete para o aumento dos fluxos comerciais e financeiros, assim como o estabelecimento de contatos e intercâmbios entre empresas e atores nas mais diversas partes do mundo.

O estabelecimento de relações comerciais é algo que acontece desde muito tempo, os fenícios na Antigüidade praticavam o comércio, na idade média, as cidades-estado italianas Gênova e Veneza realizavam o comércio de especiarias com o oriente, os portugueses e espanhóis em suas navegações tinham também o objetivo de estabelecer rotas comerciais, e mais recentemente, no século XIX a Inglaterra mantinha o controle dos oceanos com sua marinha que além da função policial, realizava o intercâmbio comercial com suas colônias.

Pelos exemplos citados, poder-se-ia presumir que a globalização vista pelo aspecto comercial não é uma novidade, entretanto, o observador mais atento percebe que em todos os exemplos, era o Estado o principal agente desse processo.

O fim do regime socialista soviético representado pela queda do muro de Berlim fez com que o foco das Relações internacionais se deslocasse das questões políticas para o mercado, suas leis e princípios, segundo o professor Ricardo Seitenfus, "do ponto de vista econômico, encontramos a internacionalização da produção, a liberalização das trocas, a supremacia do capital financeiro. As comunicações passam a permitir a eliminação das distâncias, os indivíduos e comunidades organizam-se em rede" (2004:174). A palavra globalização de origem anglo-saxônica (ou mundialização, de origem francesa) ganhou difusão pelo jornalismo econômico, sendo facilmente identificada, porém dificilmente definida.

Pode-se em certa medida concluir que a globalização se iniciou com as descobertas marítimas, avançando com o colonialismo, posteriormente o imperialismo. Porém foi o desenvolvimento do capitalismo e as conseqüências da Revolução Industrial que fizeram surgir os sinais da globalização (Seitenfus: 2004).

Dessa forma, pressupõem-se, que o fim da Guerra Fria, marcado pelo desmantelamento da União Soviética - guardiã do socialismo - as barreiras à expansão do capitalismo e à internacionalização da economia de mercado foram derrubadas. Pode-se afirmar que deixaram de existir alternativas ao capitalismo. O mundo no final do século XX tornou-se crescentemente capitalista, interligado por sistemas comerciais e financeiros.

Assim, para responder às mudanças que aconteciam as nações passaram a se organizar em blocos econômicos. O que diferencia o fenômeno da globalização atual dos exemplos anteriores, é sua dimensão, pois além dos Estados, empresas e corporações passaram a atuar como agentes dessa transformação.

O que se observa é um declínio da participação do Estado e um aumento da presença de outros atores como agentes reguladores da economia, é em certa medida o conceito do economista inglês Adam Smith o Laissez Faire1, ou seja, o mercado busca sua própria estabilidade. Conforme afirma o consultor Kenichi Ohmae "é claro que as corporações, à medida que se deslocam, trazem consigo capital de giro. Talvez mais importante, elas transferem tecnologia e Know-how gerencial" (1996: XIX).

É perceptível a participação cada vez mais crescente desses atores globais nas economias locais, além dessa participação, é importante notar também que o intercâmbio se dá com relação às questões que envolvem tecnologia e fluxos de capital. Pode-se entender este processo como um rearranjo na economia mundial causado pelos avanços técnico-científico e pela grande concentração e mobilidade de capital, "o capital se internacionaliza e investe em inúmeros paises, regiões e continentes com diferentes situações econômicas" (Carmo, 1998:6). O professor Alexandre Ratner reforça essa visão afirmando que "os interesses econômicos tendem à impulsionar ainda mais a globalização" (2003:86).

Dada a mobilidade e o fluxo de capital, a velocidade das trocas e a rapidez das comunicações, os antigos mapas políticos, com suas demarcações de fronteiras, assumem papel secundário, pois a internacionalização acontece com enorme rapidez. Vale frisar que no terreno físico as fronteiras ainda importam, porém a informação aproxima as distâncias políticas, permitindo modelar os fluxos de atividade econômica.

O que passa a ter maior importância é o que as pessoas sabem, desejam ou valorizam, afirma o professor Marcos Roberto Piscopo, que "em diferentes partes do mundo, diferentes clientes, simultaneamente, aspiram às mesmas coisas" (2005:8). Este efeito é atribuído aos avanços da comunicação, principalmente a internet, pois por sua agilidade, o mundo dos negócios tornou-se menor e mais acessível a um número maior de consumidores.

Na tentativa de atender essas demandas, as empresas vivem em ambientes altamente competitivos, pois os investidores buscam retornos rápidos e elevados e os consumidores buscam satisfazerem suas necessidades à custos cada vez menores, "o comércio internacional ocorre com base na competitividade do custo de entrega de um produto (ou seja, custo de fabricação mais custo de logística), em contraste com o preço de venda" (Ohmae, 1996:151).

O professor Seitenfus reforça esse conceito afirmando que "nos últimos vinte anos ele atingiu níveis quatro vezes superiores ao da produção mundial de bens, graças à diminuição constante da média de proteção tarifária das economias nacionais, já que mais de 95% do comércio mundial encontra-se atualmente sob as regras da OMC2" (2004:18).

Para enfrentar esse ambiente altamente competitivo, as empresas encontram-se em situações delicadas, pois ao mesmo tempo em que buscam produzir com menores custos, sofrem pressões no sentido de aproveitar as oportunidades emergentes de mercado e partir para a conquista de novos mercados, necessitando se proteger contra a entrada de novos investidores, que representam aumento da concorrência.

Diante disso, "o conhecimento adquirido pela empresa decorrente da experiência em determinado mercado alvo é fator fundamental para os processos de internacionalização" (Piscopo, 2004:10). Alianças, aquisições e fusões são as formas que novos e antigos competidores encontram para sobreviver diante do dinamismo da economia mundial. As empresas têm a difícil e desafiante tarefa de superar seus limites e ampliar seu market share. 3


1 Conceito segundo o qual o mercado se auto regula, sem a necessidade da intervenção do Estado como agente regulador.
2 OMC: Organização Mundial de Comércio, órgão das Nações Unidas com finalidade de regulamentar os relacionamentos comerciais entre os Estados.
3 Market Share: Expressão da língua inglesa que pode ser entendida como a porção do mercado detida por uma empresa.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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PERIÓDICOS

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quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Breves Comentários sobre o pensamento estratégico de Jomini e Clausewitz

Os primeiros textos científicos dedicados ao estudo da guerra e sua condução surgiram no século XIX, graças ao impacto das ciências no mundo ocidental e das guerras napoleônicas que trouxeram uma nova forma de fazer a guerra. Neste contexto surgiram as obras de Jomini e Clausewitz, fundadores do pensamento estratégico no ocidente.

Para Jomini, questões tais como: abastecimento, produção de armamentos ou de treinamento de tropas não são importantes; em sua proposta de estudo regras simples e objetivas, se seguidas, permitiriam levar a vitória. Sua base de análise eram as praticas desenvolvidas pelas guerras napoleônicas. A chave da guerra segundo o autor é a estratégia, que por sua vez é controlada por princípios científicos universais.

O método de Jomini compreendia as alternativas e formas de ofensiva, concentração de forcas e a seleção do ponto decisivo, que segundo ele trata-se do ponto culminante da guerra, no qual uma ofensiva garantiria a vitória. Em sua concepção, o mundo militar era um mundo à parte, não recebendo influências do mundo político. O autor não leva em consideração também o progresso técnico e os avanços científicos em seu modelo de guerra.

Por outro lado Clausewitz desenvolveu uma tentativa rigorosa de uma teoria da guerra amparada em conceitos filosóficos-científicos, concluindo que:
  • A guerra é um ato de força para dobrar o inimigo à nossa vontade.
  • As guerras são limitadas, ilimitadas, porém jamais absolutas.
  • Variáveis como duvida, desgaste, cansaço, medo, erros e acidentes são considerados como fatores de fricção que devem ser encarados como limitadores, sendo necessário a intermediação da política para a conclusão da guerra.
  • A guerra é um instrumento da política, só tendo sentido no mundo político.
  • O objetivo da guerra, para todos os lados, era desarmar o inimigo.
Para Clausewitz, a guerra é um jogo de incerteza e acaso, que faz com que os responsáveis por sua condução moderem o emprego da força evitando a chegada aos extremos da violência. A guerra é dominada por fatores morais e constituída por uma trindade composta por governo, força e povo.

Para o autor, o combate acontece primeiro de forma virtual, ou seja, os comandantes travam a batalha virtualmente para avaliar as possibilidades, podendo evitar resultados desfavoráveis. Em se tratando do combate real, a defesa possui vantagens sobre o ataque, pois esta só tem que manter posições, enquanto que o atacante, além de defender, tem que conquistar novas posições. O ataque possui um ponto culminante, que quando atingido, representa os limites do objetivo da guerra e seu prosseguimento além desse ponto coloca em risco tudo que se obteve até então.

Existem entre o pensamento de Clausewitz e de Jomini certas discrepâncias com relação a conceitos tais como estratégia, que para Jomini é a arte de fazer a guerra sobre o mapa, dividida em tática e grande tática que vem a ser a distribuição de tropas no campo de batalha de acordo com sua geografia. Já para Clausewitz a tática consiste em usar as forças no combate e estratégia é o uso dos combates para atingir os objetivos da guerra.

Pode-se ainda citar que para Clausewitz não existe uma ciência que garanta uma vitória na guerra, cabendo a condução da mesma ao critério de cada responsável pelos combates, enquanto que para Jomini, os princípios da guerra são eternos, universais e científicos que se cumpridos garantem a vitória.

Referências Bibliográficas

PROENÇA Jr., Domício, DINIZ, Eugênio & RAZA, Salvador G. Guia de Estudos Estratégicos. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1999.