terça-feira, 29 de março de 2011

ALGUMAS PALAVRAS SOBRE DEFICIÊNCIA E EXCLUSÃO

 Artigo originado a partir da monografia "Livro Falado", apresentada em dezembro/2004 no curso de Pós Graduação em Docência do Ensino Superior.

Conviver com um deficiente nos ensina muito a enxergar as pessoas pelas qualidades e não aparências. Nos faz crescer pessoalmente” (Luciana Siqueira).

Ao longo do tempo, em várias civilizações, as pessoas portadoras de alguma característica que as diferenciava do padrão normal estabelecido pela sociedade receberam os mais variados tipos de tratamento. Em algumas civilizações foram divinizadas, como no Egito antigo, sacrificadas (eutanásia) na Grécia, tidas como bruxas, rejeitadas, super protegidas e até mesmo como pessoas dignas de receber gestos piedosos e assistencialismo.

A OMS (Organização Mundial de Saúde) estima que cerca de 10% da população mundial é portadora de algum tipo de deficiência física, sensorial ou mental, congênita ou adquirida. As deficiências dividem-se em três tipos: físicas, sensoriais, que por sua vez se subdividem em deficiências auditivas e visuais, e as deficiências mentais. O senso comum qualifica uma pessoa deficiente como um indivíduo incapaz de, por si mesmo, garantir a satisfação das necessidades de uma vida social normal.

Esse impedimento, segundo o jornalista João B. Cintra Ribas, “diz respeito a uma alteração (dano ou lesão) psicológica, fisiológica ou anatômica em um órgão ou estrutura do corpo humano” (1983:10). O deficiente físico ou portador de necessidades especiais é tido como pessoa incapaz que precisa de ajuda para toda e qualquer atividade que vá executar e visto como se necessitasse de caridade constantemente.

Percebe-se que o termo ‘deficiente’, apesar das várias tentativas que se promove para amenizar seus impactos, permanece com um significado forte, pois se opõe à palavra ‘eficiente’. Sob este prisma, ser diferente significa não ser capaz, eficaz. Tal conceito pode ser totalmente equivocado, pois, conhecendo-se a pessoa, pode-se perceber que apesar de possuir restrições para determinado tipo de ação, outras habilidades são mais bem desenvolvidas para compensar aquela ou aquelas que causam restrição.

O Decreto Federal nº 914/93 diz que deficiente é "aquela pessoa que apresenta, em caráter permanente, perdas ou anomalias de sua estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica, que gerem incapacidade para o desempenho de atividades, dentro do padrão considerado normal para o ser humano".

A Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes, em seu artigo 1º qualifica o deficiente físico como sendo “qualquer pessoa incapaz de assegurar por si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência, congênita ou não, em suas capacidades físicas ou mentais”.

Para o professor Marcos Mazzotta é “em relação ao meio onde vive a pessoa, à sua situação individual e à atitude da sociedade, que uma condição é ou não considerada uma deficiência” (1993:12). Partindo-se desse pressuposto, todas as pessoas de uma forma ou de outra possuem algum tipo de ‘deficiência’.

Infelizmente, apesar desse tipo de situação ser clara e de fácil constatação, não é aceito pela grande maioria. As pessoas com alguma característica física visível são estigmatizadas e embora tenham sido criadas na mesma sociedade que seus pares, não são por eles reconhecidas e acabam sendo excluídas ou marginalizadas, por conta desta diferença. Dessa forma pode-se entender que “as relações estabelecidas entre sociedade e deficiência é que determinam a incapacitação, a desvalorização e a exclusão das pessoas com deficiência” (Correr, 2003:26).

Essa exclusão se expressa em normas formais ou informais que impedem o acesso de grupos de indivíduos aos direitos, ou parte deles, dos quais gozam aqueles que desfrutam da plena cidadania. Isso pode ser facilmente percebido nas propagandas veiculadas na mídia. Nelas os personagens idealizados são sempre perfeitos, coroados pelo sucesso e isentos de falhas.

Esse tipo de ação é nociva, pois incute, no imaginário da massa, a falsa impressão de que aqueles que não estiverem em conformidade com o padrão divulgado não devem receber atenção por parte dos demais; restando-lhes viver à margem daquele mundo ‘ideal’.

O que se percebe é que “exclusão e inclusão não tem nada a ver com classe, sexo, raça, nacionalidade, nem outras categorias sociológicas; tem a ver com conduta humana” (Jackson, 1992:274; apud Griffths, 2004:211). Há diferenças naturais entre os homens e quanto a essas nada pode ser feito. Entretanto, as diferenças sociais que algumas vezes decorrem das diferenças naturais, podem ser minimizadas com ações conscientizadoras, que visem a aceitação da diversidade e sua incorporação no âmbito social.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Um Espectro Chamado Alemanha? - Formação Nacional e Expansionismo Germânico

Artigo publicado no Livro Politicas e Conflitos Internacionais. Ed. Revan 2004.



A Alemanha não é fácil de explicar. Nem se trata só do problema de se enveredar por eu passado recente, que apesar dos esquemas mentais consagrados ainda oferece enorme campo aberto à reflexão”. Günter Wallraff


Desde seus primórdios como Estado organizado, tomando-se como ponto de partida sua unificação por meio de guerras e posteriormente seus avanços tecnológicos, poderio econômico, militar e naval, a Alemanha pôde ser considerada como um agente desestabilizador do equilíbrio europeu, tornando-se conseqüentemente uma ameaça aos seus vizinhos. Segundo Kenneth Waltz (1.979), num sistema multipolar, que era o sistema vigente no final do século XIX e início do XX, cada ator procura realizar seus objetivos estratégicos sem recorrer à guerra, utilizando-a somente como ultima ratio para a proteção dos seus interesses, porém a guerra, quando utilizada, visa a realização de objetivos e não a eliminação de outro ator, pois o número de atores está relacionado ao equilíbrio do sistema. Esse sistema recusa ainda um órgão supranacional e não cria a possibilidade de hegemonia, além de reintegrar os vencidos no sistema internacional, a fim de evitar a formação de bipolaridades.

Ocorre que o temor que a Alemanha inspirava em seus vizinhos favoreceu o surgimento de alianças de defesa mútua que comprometeram o sistema de equilíbrio existente até então. As alianças originaram dois pólos antagonistas. Com a instauração desses blocos antagônicos, uma situação de fricção foi configurada e diante da instabilidade que essa situação proporcionou, as mínimas provocações passaram a servir como fatores de atrito entre as partes, acumulando-se, até o ponto em que um acontecimento remoto, que nenhum dos atores considerou significativo, serviu como estopim para a eclosão do conflito armado.

A Primeira Guerra Mundial trouxe consigo enormes avanços tecnológicos, porém segundo Marc Ferro “gastos pela guerra, os mecanismos econômicos ameaçavam quebrar-se, o tecido social rasgar-se, a relação de autoridade desaparecer” (2.002, p.229). A guerra exigiu muito dos Estados envolvidos, de forma que quando de seu término, os atores internacionais, tanto os beligerantes, quanto os espectadores, aspiravam por uma época de paz para que pudessem se recuperar. Afirma Adriano Moreira, que a guerra teve como conseqüências a “dissolução dos impérios centrais, revoluções internas não previstas e a revisão final da hierarquia das potências” (1.999, p.282), todos resultados que não foram cogitados quando de sua deflagração, tornando necessário um novo rearranjo do sistema internacional, tendo em vista que “o desequilíbrio e disfunção dos sistemas, cuja mais grave manifestação é a guerra, exige que o estado de natureza seja eliminado ou contido por uma nova ordem” (id, p.287). Esse novo ordenamento, ao contrário do sistema multipolar anterior, previa a existência de um organismo supranacional que regulasse as relações internacionais. Porém, no ordenamento internacional anterior, os vencidos eram reintegrados ao sistema, fato que não ocorreu imediatamente no caso da Alemanha.

Pelo acordo de paz, a Alemanha perdeu suas colônias e cedeu territórios aos seus vizinhos, conseqüentemente sua população foi reduzida, suas jazidas de carvão passaram a ser exploradas pela França, além das reparações em espécie que deveria pagar aos aliados, redução do exército, assunção da responsabilidade pela guerra e suas conseqüências, à essas condições podem ser acrescidas ainda, à situação interna alemã que se encontrava conturbada, com movimentos políticos tanto à direita, quanto à esquerda, além dos grupos desmobilizados do exército que atuavam como mercenários dentro de seu território. Solapar a economia do inimigo passou a ser um objetivo de guerra, tanto quanto lhe infligir uma derrota militar (Carr, 2.001).

É possível traçar paralelos entre o que os teóricos do poder consideram como elementos necessários e usados para medir o poder de um Estado, fator geográfico, populacional, recursos naturais, recursos militares e moral nacional, e a situação que o tratado de Versalhes impôs à Alemanha. Partindo do pressuposto realista de que as relações entre Estados são relações de poder, nas quais, cada um busca obter mais fatores de persuasão que o outro a fim de equilibrar a balança de poder a seu favor e como demonstrado, a economia era a fonte do poder da Alemanha, pode ser percebido que a preocupação principal era alterar a balança de poder na Europa, em favor da França, que se utilizou de todos os recursos ao seu alcance para atingir seus objetivos, na tentativa de transformar a Alemanha em um Estado fantoche nas mãos das grandes potências. Adriano Moreira traça considerações sobre o uso operacional da balança de poder, que serve como “instrumento destinado a promover interesses ou alcançar objetivos” (id, p.235).

A idéia de equilíbrio de poder que remete à “mecânica do poder”, basicamente pode ser entendida como sendo a contenção de uma potência pelas demais que fazem parte do sistema internacional. Segundo Martin Wight, “a história demonstra claramente que o equilíbrio do poder é a política por intermédio da qual a maior parte dos Estados procuraram, na maioria dos casos, obter sua auto-preservação" (2.002, p.185). Estas reflexões estão baseadas no pensamento hobbesiano de que os Estados e os homens competem, tentando impor seu domínio uns sobre os outros. Para Hobbes, “o poder de um homem (universalmente considerado) consiste nos meios de que presentemente dispõe para obter qualquer vivível bem futuro” (1.988, p.53). Para Wight (2.002), todos os Estado estão sujeitos a configurações de poder, sendo que uma potência tem maior liberdade para modificar essa configuração, tendo em vista a influência que exerce sobre seus vizinhos mais fracos.

Dessa forma, apesar de todo o revestimento de legalidade que o Tratado de Versalhes procurou emprestar às ações dos Aliados com relação a Alemanha, na ânsia de satisfazer os próprios interesses, não se levou em conta os sentimentos que poderiam ser despertos dentro da própria Alemanha, avessa aos termos do tratado de paz. Vale lembrar ainda que a transição do regime semi-absolutista do kaiser Guilherme II para o regime parlamentar da República de Weimar após a Primeira Guerra Mundial, ocorreu de forma repentina e foi inesperada para várias camadas da população, ficando associada de forma desagradável com a derrota na guerra. Segundo Norbert Elias, “desde os primeiros momentos do período de Weimar, muitos homens e mulheres manifestaram, de fato, o desejo de ver um homem no topo, fosse ele príncipe ou ditador, que tomasse as decisões e desse as ordens” (1.997, p.261).

A própria constituição da república de Weimar deixa entrever esse desejo latente e possível paradoxo entre império e república. Em seu artigo primeiro, que diz: “o Reich alemão é uma República” (Claude Klein, 1.995, p.91). Segundo comentários do autor, a menção à república só aparece neste artigo, sendo que o restante do documento trata o Estado alemão como um reino. Os aliados alimentaram esse desejo alemão ao permitir que a república proclamada tivesse como dirigentes membros do antigo regime. Conforme afirma Wight, “o Acordo de Versalhes foi o único acordo geral de paz que conferiu à potência dominante derrotada um maior domínio potencial sobre a Europa do que aquele que de fato havia levado à guerra” (2.002, p.204). Quando executado, conferiu à Alemanha uma importância que ela não possuía antes da guerra, uma vez que deixava os vencedores dependentes das compensações que deveriam ser pagas.

Partindo dessa afirmativa, é possível levantar hipóteses sobre o sucesso que o partido nazista teve junto à população, pois o desejo latente de um líder, somado aos altos e baixos que a República de Weimar sofreu, deixou a situação propícia para um movimento de massas que no imaginário popular representasse uma tábua de salvação. Hitler chegou ao poder com o apoio majoritário da população alemã e a classe dirigente via sua ascensão como um obstáculo ao comunismo e a possibilidade de liberdade de ação dentro do Estado.

As massas foram levadas a acreditar que ele poria fim a crise econômica e a inflação que as atingia. Porém, segundo o historiador Jacques Droz “a partir do momento em que Hitler tomou conta do poder, a Alemanha transformou-se num país militarizado” (1.999, p.97). Hitler assumiu o governo e começou a realizar movimentos a fim de garantir a auto-sustentabilidade da Alemanha em caso de guerra, bem como principiou o rearmamento do Estado. A propaganda passou a ser massivamente empregada, mobilizando toda a nação. Aos poucos Hitler, foi transformando a constituição, alterando leis fundamentais, “criando um Estado unitário, autoritário e popular” (Droz, 1.999, p.98).

Em 1.938, a Áustria e os Sudetos (região de língua alemã da Tchecoslováquia) foram anexados por Hitler. A expansão para o leste teve prosseguimento com a invasão da Polônia, em 1.939, ocasião em que o conflito foi oficialmente reconhecido. A Inglaterra, que havia tentado apaziguar os desejos expansionistas de Hitler, contemporizando suas ações, se viu compelida com este ato a cumprir sua palavra de que protegeria a Polônia em caso de ataque alemão.

Segundo Droz (1.999), graças ao preparo superior em armamentos e suprimentos, nos três primeiros anos da guerra, a Alemanha obteve vários sucessos; as ocupações da Polônia (1.939), França (junho 1.940), Iugoslávia e Grécia (maio 1.941) e finalmente contra os russos, conquistando extensos territórios do Cáucaso ao Golfo da Finlândia (1.941-1.942). O expansionismo alemão foi detido novamente pela ação conjunta das principais potências do cenário internacional (Estados Unidos, Inglaterra, Rússia e França) e os demais países do sistema internacional contrários à Alemanha. Assim, em 1.945, as tropas aliadas invadiram a Alemanha, forçando sua rendição.

Conforme afirma Oliveira-Ramos, com a capitulação do Estado alemão, os aliados desenvolveram um plano para “assegurar que a Alemanha não voltasse a perturbar a paz mundial” (1.995, p.144). O Estado alemão foi partilhado em quatro zonas de influência, cabendo a administração de cada zona a uma das potências vencedoras, que as ocupou, inclusive com tropas. Tendo em vista o alinhamento existente entre Estados Unidos, França e Inglaterra, as zonas sob administração desses Estados acabaram unificadas, sob o nome de República Federal Alemã, enquanto que à parte administrada pelos russos, coube a denominação de República Democrática Alemã.

 O historiador Droz afirma que “desde logo estava realizada a cisão entre os dois Estados” (1.999, p.118). Isso se deu devido às diferenças ideológicas que norteavam os regimes que administravam os dois territórios alemães. A Alemanha, dividida em duas, teve cada parte de si sob a influência de um dos pólos de poder que principiavam a se definir – Estados Unidos e União Soviética - evoluindo ao período conhecido como Guerra Fria.

Preocupados com a instabilidade do continente europeu, os Estados Unidos elaboraram um plano de reconstrução para a Europa, o Plano Mashall, que injetou em 1.947, quantias consideráveis para financiar a retomada do crescimento no pós-guerra. Neste período pós-guerra, a Europa Ocidental deparava-se com três problemas que urgiam solução, eram eles, o perigo de guerra, tanto com a União Soviética e seus aliados, quanto entre a França e a Alemanha; a fome e a dependência de alimentos vindos do exterior.

Segundo Arnaud (1.996) os secretários de Estado para Relações Exteriores dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha, solicitaram em 1.950 que Robert Schuman, ministro para Assuntos Exteriores da França, apresentasse uma proposta para a integração da Alemanha Federal no contexto ocidental. A solução encontrada foi um modelo de integração e cooperação que tornaria qualquer guerra um ato impensável e materialmente impraticável. Dessa forma, Schuman propôs a criação de uma associação para administrar a produção franco-alemã de carvão e aço, denominada de Comunidade Européia do Carvão e Aço (CECA). Iniciava-se o complexo processo de integração econômica, que no final dos anos 90 do século XX culminaria na União Européia. A Alemanha tornou-se uma espécie de Estado tampão dividido, que servia tanto para conter o comunismo de leste, quanto o capitalismo do oeste. O muro de Berlim, erguido pelos russos, a fim de demarcar a divisão do ocidente com o oriente, tornou-se o marco de tal disputa.

Com o colapso da União Soviética, no final dos anos 80 do século XX, começaram as negociações para a reunificação das Alemanhas. A queda do muro marcou esse momento de reunião. Entretanto, conforme artigo do jornalista Clóvis Rossi, “o muro de Berlin libertou um fantasma” (Folha de São Paulo, 04.11.1999), esse fantasma aludido no artigo, era o medo na Europa do ressurgimento do desejo expansionista alemão que havia marcado a primeira metade do século XX. Esse receio surgiu porque a Alemanha na época da reunificação era a terceira potência econômica mundial, acrescentando à sua população mais 20 milhões de pessoas, totalizando uma população de 80 milhões de habitantes. Além disso, as tropas estrangeiras que ocupavam seu território desde 1.945, começaram a ser evacuadas.

Para refletir as realidades do mundo no século XXI, após a queda do muro de Berlim e do fim da Guerra Fria, surgiram discussões sobre a necessidade de incluir o Japão e a Alemanha reunificada nos órgãos internacionais de decisão, de forma a reconhecer o status de segunda e terceira potências econômicas, respectivamente, sendo que representavam importantes provedores de fundos internacionais. Essa necessidade previa também a inclusão dos dois Estados, como membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU. Entretanto, a alegação norte-americana, no ano de 2.002, de que o Iraque possuía armas de destruição em massa, e sua insistência para que o Conselho de Segurança da ONU deliberasse a favor de uma intervenção armada contra aquele país, veio encontrar a França e a Alemanha, inimigas históricas, afinadas na oposição do uso da força para resolver a situação que se configurou no Iraque.

 Essa situação demonstrou a existência de divergências de opinião dentro da União Européia que já podiam ser vistas com relação ao Euro, a moeda da União Européia, adotado em 01/01/1999 por quase todos os Estados membros, com exceção da Inglaterra que prega revisões no modelo de integração, para que o objetivo proposto seja atingido. Segundo as palavras de seu Primeiro Ministro, Tony Blair, em discurso proferido perante o European Research Institute, em 23.11.2001: “a conclusão a extrair desta argumentação não é a de que devemos aderir ao Euro em quaisquer condições econômicas, mas antes a de que, caso as condições econômicas sejam satisfatórias, não devemos ser impedidos de aderir”. A preocupação dos britânicos pode ser entendida de forma simples como o receio de que a adesão ao Euro comprometa a conversibilidade da libra.

Apesar de seu histórico bélico, o que se viu, porém, foi outro tipo de atitude por parte do Estado alemão, que apesar de ser a primeira potência econômica da Europa continental e principal membro da União Européia, adotou e tem adotado uma postura conciliatória na situação de crise internacional atual que se configurou diante dos debates sobre a intervenção armada contra o Iraque. É possível perceber nesta postura alemã, um elemento presente, seja no período que este trabalho procurou compreender ou nos períodos subseqüentes que brevemente foram descritos, o fato de que a Alemanha desde sua formação lutou sempre para estabelecer e manter sua posição e projeção no cenário internacional, como potência de primeira grandeza, sendo um ator com acentuada capacidade de decisão e influência política, econômica e militar.


Referênicas Bibliográficas:

CARR, Edward Hallet . Vinte Anos de Crise, 1919-1939. 2a.edição.Brasília. UNB, 2001.
DROZ, Jacques. História da Alemanha. Portugal.Europa-América, 1999.
ELIAS, Norbert. Os Alemães- A Luta pelo Poder e a Evolução do Habitus nos séculos XIX e XX. Rio de Janeiro. Jorge Zahar Editores, 1997.
FERRO, Marc. A Grande Guerra 1914 – 1918. Lisboa, Portugal. Edições 70, 1990.
HOBBES, Thomas. O Leviatã. São Paulo. Nova Cultural, 1988.
MOREIRA, Adriano. Teoria das Relações Internacionais. 3a edição. Coimbra, Portugal. Almedina, 1999.
OLIVEIRA, A. Ramos. Historia Social y Politica de Alemania. Vol. I. México. Fondo de Cultura Economica, 1995.
ROSSI, Clóvis. O Futuro da Alemanha, in Folha de São Paulo, Caderno Especial. Folha de São Paulo, 04/11/1989.
SOMBRA SARAIVA. José Flávio. Relações Internacionais Contemporâneas, da Construção do Mundo Liberal à Globalização- de 1815 a nossos dias. Brasília. DF. Paralelo 15, 1997.
WALTZ. Kenneth N. Teoria das Relações Internacionais. Lisboa. Gradiva, 2002
WIGHT. Martin. A Política do Poder. Brasília, DF. UNB, 2002.

Internet

terça-feira, 15 de março de 2011

Para Refletir

Praticamente 25 anos se passaram desde a madrugada de 26 de abril de 1986,  estamos em um novo século, porém vemos imagens que nos deixam novamente entre paralisados e pensativos.

O acidente nuclear no Japão, que a cada dia aumenta em proporção, nos traz a memória aquele outro evento sinistro que marcou os últimos anos do século XX.

Não pretendo me estender muito em discursos em defesa ou contra os usos da energia nuclear, deixarei isso para os ambientalistas. Tenho a minha opinião formada sobre a questão.

Quero somente deixar esse registro e convidar todos que por aqui passarem para refletir um pouco sobre essa questão. 


Fotos de Chernobyl


Fonte das fotos:




sábado, 12 de março de 2011

Um pouco sobre Auditoria Interna

 
Excerto da monografia Relaciomento Interpessoal e Auditoria Interna apresentada no curso de pós-graduação em Auditoria- Dez\2010.


As várias alterações socioeconômicas que ocorrem em velocidade cada vez maior alteram as características do mundo como conhecemos. O mundo dos negócios se torna cada dia mais competitivo e as inovações tecnológicas possuem grande contribuição nesse aspecto. Tais mudanças obrigam as empresas a se sujeitarem a novos métodos de trabalho, novos processos e metodologias, levando a uma revisão de paradigmas por parte das organizações.

                           Tantas mudanças e inovações fazem com que cada vez mais, as empresas se foquem em seus objetivos para que possam se manter competitivas no mercado que evolui diariamente. Essa necessidade de assegurar a continuidade dos negócios também se reflete na preocupação com a qualidade, produtividade e inovação resultante do conhecimento no trabalho.

                          Dessa forma, aumenta a demanda para a adoção de medidas e técnicas de acompanhamento e controle que visam minimizar falhas e evitar problemas que coloquem em risco a imagem da entidade, diante dos acionistas, dos clientes e do mercado em geral.
                           
                            Neste contexto surge a auditoria interna como atividade, de suma importância para as empresas no que compete quanto à avaliação de controles e sugestão de ações e ajustes com vistas à melhoria dos processos, contribuindo para a evolução do processo da governança corporativa.

Os trabalhos de Auditoria Interna têm por objetivo aferir a adequação da gestão dos riscos operacionais, dos controles internos e do processo de governança corporativa de forma a garantir que tais processos funcionam em conformidade com o planejamento, propondo recomendações para a melhoria dos processos em termos de eficiência, eficácia, efetividade, economia e desempenho.

A auditoria interna se constitui num conjunto de procedimentos, normatizados, atuando por meio de acompanhamento dos processos de trabalho, avaliações de resultados e proposição de ações de melhoria e corretivas para possíveis desvios da gestão, “é verdade que nem todos os dirigentes estão correctamente informados sobre tudo aquilo que a auditoria interna poderá fornecer e as observações do tipo ‘ah, não sabia que vocês podiam fazer isso!’ Não são raras (Barbier, 1992, p. 25).

Os trabalhos são executados por profissionais denominados auditores internos, que tem como característica principal o assessoramento diferenciado à alta administração da empresa, buscando agregar valor à gestão. Segundo Cook & Winkle, “a averiguação e avaliação dos sistemas de controle interno, tanto contábil como administrativo, é função da auditoria interna” (1981, p. 147).

Todos os sistemas, processos, operações e atividades da empresa estão sujeitos às avaliações dos auditores internos, de acordo com seu planejamento anual de trabalho. O planejamento da auditoria baseado num conhecimento aprofundado da empresa, do negócio e da organização e dos homens (Barbier, 1992) é o ponto de partida para a realização dos trabalhos que contemplarão testes que permitam aferir a aderência do processo avaliado, esses “testes constituem uma técnica fundamental para a auditoria de hoje, em contraposição àqueles exames pormenorizados de transações dos primórdios da profissão” (COOK & Winkle, 1981, p. 14) e serão eles que embasarão as conclusões do auditor sobre o processo avaliado.

O julgamento do auditor interno, baseado nas evidências, não deve sofrer influências de interesses particulares ou opiniões alheias. Dessa forma a independência e imparcialidade são essenciais para a auditoria, pois “aquilo que uma pessoa lhe diz terá muitas vezes de ser validado junto de uma outra, e o número de horas extras que será necessário trabalhar caso haja um fracasso: os nossos exames não merecem comentários especiais” (Barbier, 1992, p. 117). O mesmo autor (1992) afirma ainda que, é mais o espírito de conexão, o comportamento daquele a quem o serviço está ligado e a força de caráter dos auditores que irá garantir a sua independência e eficácia.

Como atividades básicas da Auditoria Interna, pode-se citar:

    - Revisão e avaliação da eficácia, suficiência e aplicação dos controles contábeis, financeiros e operacionais;
    - Determinação do grau de confiança das informações contábeis e de outras naturezas;
    - Verificação da aderência às normas internas e legislações pertinentes;
    - Avaliação da qualidade alçada na execução das tarefas determinadas para o cumprimento das respectivas responsabilidades.

Para sua atuação, o Auditor Interno necessita de tranqüilidade e de segurança, atuando com independência, amparado com os seguintes fatores:

- Liberdade para investigar, selecionarator e executar suas atividades (acesso irrestrito);
- Exercer apenas o papel de assessoramento, cabendo aos gestores a tomada das decisões administrativas;

- Atuação dedicada à atividade sem interferência nas Áreas Operacionais.


A função de auditoria interna é regulamentada por Normas Internacionais, que procuram estabelecer as características de organizações e indivíduos que realizam atividades de auditoria, bem como descrever a natureza das atividades da auditoria interna e critérios de qualidade para avaliação do desempenho dos serviços. Emitidas pelo The Institute of Internal Auditors – IIA, as normas para a atividade concentram:

1 - Código de ética;
2 - Normas de Atributos;
3 - Normas de Desempenho.

Além das questões técnicas e comportamentais, requer também que respeite a hierarquia existente, sigilo, observar usos e costumes geralmente aceitos, bem como porta-se de acordo com sua função e posiçãoÉ importante ressaltar que todas essas normas de conduta, por melhor que sejam aplicadas, se não forem compreendidas pela outra parte do processo de comunicação não valem de nada, pois pode ocorrer uma interpretação equivocada do real sentido, aumentando as distâncias entre auditor e auditado.

O processo de auditoria, é também uma atividade que envolve o interrelacionamento entre as pessoas, que pode ser considerado como o fator determinante para o sucesso ou fracasso de um trabalho de auditoria. Faz-se necessário estabelecer relacionamentos, de forma que haja reciprocidade, para que os envolvidos vislumbrem vantagens e não se sintam perdendo em detrimento do auditor.

A convergência de interesses evita o surgimento ou propicia a resolução de conflitos, pois “os conflitos existem justamente porque somos pessoas que existem em relação com outras pessoas, e é por meio dessas relações que viabilizamos a nossa existência e promovemos a nossa co-evolução” (Rechtman e Bulhões, 2004, p. 21).

Os seres humanos interagem com o mundo por meio de seus sentidos (visão, olfato, audição, paladar e tato) e “tendem a acreditar que sua percepção do ambiente corresponde à realidade objetiva” (Carvalhal e outros, 2006, p. 65). Corroborando essa afirmação, King diz “que os primeiros cinco minutos de qualquer relação são extremamente importantes e cruciais” (1987, p. 7).

Nestes primeiros cinco minutos, os indivíduos trazem uma grande bagagem cultural, social, psicológica e profissional (King, 1987) que entra em ação para promover o julgamento da realidade, sendo que a linguagem verbal, linguagem não-verbal, preparação, habilidade para ouvir, carisma, percepção, controle emocional e controle físico são elementos essenciais dessa bagagem.

É a combinação desses elementos que faz com que a outra pessoa se interesse e passe a respeitar seu interlocutor, “o fato é que avaliamos as coisas e as pessoas indiretamente, na maior parte dos casos, levando em consideração os sinais indiretos que denotem sua verdadeira qualidade (ou falta dela)” (Marinho, 2005, p. 34). O primeiro impacto de um contato é que produzirá uma impressão positiva ou negativa relativa à pessoa, embora essa impressão possa ser alterada no decorrer do tempo, ela tem relevância na formação da opinião e sentimentos sobre a outra parte.

Uma comunicação aberta e um relacionamento franco são fatores propícios que permitem à outra parte adquirir respeito, confiança e credibilidade no interlocutor. Afirma Barbier que é “necessário realizar reuniões abertas sem que muitas pessoas invadam o escritório do interlocutor, criar um ambiente propício ao diálogo, não confundir uma auditoria com uma audição conduzida por um juiz de instrução de um inquérito, aceitar as digressões, solicitar opiniões, falar das mil e uma coisas que dão vida à empresa” (1992, p. 122). Cabe pois ao auditor desenvolver habilidades que permitam uma comunicação clara e sem interferências com o objetivo de alcançar seus propósitos na realização do trabalho.

É fato que ninguém gosta de ser fiscalizado, ainda mais quando as atitudes do fiscal não contribuem para que o processo seja conduzido sem traumas e percalços. O auditor precisa estar sempre certo de que é compreendido, evitando usar expressões ambíguas ou vagas, pois segundo Goleman, “os otimistas vêem um fracasso como devido a algo que pode ser mudado, para que possam vencer da próxima vez, enquanto os pessimistas assumem a culpa pelo fracasso, atribuindo-o a alguma imutável característica pessoal” (1995, p. 101).

O clímax da relação auditor x auditado, encontra-se no relacionamento que estabelecem durante a realização dos trabalhos, pois segundo Pease (2006) sentir-se importante é uma necessidade humana que se apresenta com mais intensidade do que as necessidades fisiologicas, tais como alimentar-se, uma vez que após comer, deixa-se de sentir forme. Ser valorizado é mais forte do que receber amor ou sentir-se seguro, pois uma vez satisfeitas essas necessidades, elas deixam de ser problemas.





REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARBIER, Etienne. Auditoria Interna, Como? Porque? Mem Martins, Portugal: Edições CETOP, 1992.
COOK, Jonh W. & WINKLE, Gary M. Auditoria: Filosofia e Técnica. São Paulo: Saraiva, 1981.
CREPALDI, Silvio Aparecido. Auditoria Contábil Teoria e Prática. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2002.
FISHER, Roger, et al. Como Chegar ao Sim, a negociação de acordos sem concessões. Rio de Janeiro: Imago, 2005.
GOLEMAN, Daniel. Inteligência Emocional – A Teoria Revolucionaria que redefine o que é ser inteligente. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
KING, Norman. Os primeiros 5 Minutos. São Paulo: Nobel, 1991.
LIEBERMAN, PH.D. David J. Como Mudar Qualquer Pessoa. São Paulo: Novo Século, 2008.
PEASE, Alan & Barbara. Como conquistar as pessoas. Rio de Janeiro: Sextante, 2006.
SÁ, A.Lopes de. Curso de auditoria. S.Paulo: Atlas, 1980.
SANTI, Paulo Adolpho. Introdução à auditoria. São Paulo: Atlas, 1988.
THOMAS, David C. & INKSON, Kerr. Inteligência Cultural, instrumentos para negócios globais. Rio de Janeiro: Record, 2006.


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segunda-feira, 7 de março de 2011

Inteligência Cultural - uma habilidade necessária ao gerente globalizado

Excerto da monografia homonima apresentada no curso de pós-graduação em Gestão Estratégica e Qualidade - Dez\2007.


"Conhecer e pensar não é chegar a uma verdade absolutamente certa, mas dialogar com a incerteza" (Edgar Morin).


Diante da dinâmica de um mundo globalizado, "a inovação permanente constitui um dos aspectos mais importantes para as empresas atualmente" (Souza, 2005:7), essa inovação garante além da manutenção no mercado, suas vantagens competitivas em um ambiente cada vez mais diversificado e em constante mudança.

Existem muitas variáveis, que se multiplicam a todo o momento, na atual situação global. "Por mais bem instrumentada que esteja a empresa para digerir informações e democratizá-las a seus vários escalões, sempre haverá oportunidades laterais a serem prospectadas" (Sebben e Filho, 2005:191). Dados estatísticos apontados por Carmo (1998), demonstram que o inglês é a língua mais utilizada em 85% das ligações internacionais, em 75% da correspondência mundial e em mais de 80% dos livros científicos publicados.

A participação de negócios internacionais, no PIB brasileiro, tem aumentado significativamente nos últimos anos e o governo prevê em seus planos cada vez mais a busca de novos mercados, a fim de promover a entrada de recursos no país. Por este cenário é fácil concluir que os negócios internacionais terão cada vez mais prioridade na agenda econômica. Afirmam Rechtman e Bulhões que "por conta disso, passa a ser um requisito básico para a formação dos executivos a capacidade de negociação, não bastando o perfil gerencial típico do sistemático cobrador de resultados" (2004:66).

Depreende-se dessas afirmações que o preparo constante a fim de se acompanhar a evolução dos mercados globalizados, para se aproveitar as oportunidades que surgem, é fator essencial para a garantia da manutenção da competitividade de uma empresa, e conseqüentemente sua sobrevivência. Tendo em vista que é em seu quadro de funcionários que uma empresa está amparada, e dele depende para seu sucesso, o princípio do preparo constante, estende-se automaticamente à esses colaboradores responsáveis pela sobrevivência da empresa.

A educação assume neste contexto papel importante, pois deve como recomenda Morin "contribuir para a autoformação da pessoa (ensinar e assumir a condição humana, ensinar a vida) e ensinar como se tornar cidadão" (1999:65). Trata-se de estimular o desenvolvimento da inteligência e suas múltiplas facetas, para que as pessoas tenham a habilidade de adaptar-se às diferentes situações e também de modificá-las. A consultora Suzana Doblinski reforça essa afirmação argumentando que "inteligência é respeitar a história e a validade do que existe e a partir disso transformar" (1997:202).

Dessa forma pode-se tornar sensível ao fato de que em geral os indivíduos tendem a presumir fatos amparados pela visão de sua própria cultura, ignorando os referenciais culturais da outra parte que exigem um outro olhar.


"Os preconceitos e os estereótipos são comuns na vida internacional. Português é burro, argentino é pedante, judeu é avaro, armênio é esperto, sueco é frio, russo é alcoólatra, espanhol é grosso, francês é afetado, americano é limitado, italiano é espalhafatoso, dinamarquês promíscuo, paraguaio é rancoroso, brasileiro é trapaceiro, alemão é neurótico, japonês é desconfiado e assim sucessivamente" (Sebben e Filho, 2005:197).


 
Todos esses estereótipos e pré-julgamentos criados no imaginário das pessoas ilustram bem os risco que se pode incorrer tendo-os como bases norteadoras para o estabelecimento de um relacionamento comercial. "Parece óbvio que a efetivação de uma coalizão depende da confiança entre os indivíduos que dela participam" (Marinho, 2005:118).

Segundo Kerr e Inkson, "o fato de ingressar em um ambiente desconhecido leva algumas pessoas a aprender ativamente sobre a nova cultura, enquanto outros tentam evitá-la, geralmente tentando reproduzir a cultura antiga na nova situação" (2006:44). Vale lembrar que a mão-de-obra por sua vez, também está se tornando globalizada ampliando dessa forma o desafio, pois em âmbito local já é possível perceber os reflexos globais.

Dessa forma, superar as barreiras de interação entre os indivíduos com diferentes culturas, voltados para um único objetivo, configura-se no mais novo desafio para os coordenadores de equipes que envolvam essa mescla cultural, pois "quando duas pessoas interagem, a transformação de estado de espírito ocorre da mais expressiva para a mais passiva" (Goleman, 1995:129).

Esse processo ocorre entre seres humanos e pressupõe um intercâmbio de informações, a fim de que se altere determinado status, dessa forma faz-se necessário o uso de flexibilidade e empatia, pois as pessoas tendem a ignorar informações que questionam suas crenças, valores e preferência, levando a um conhecimento superficial e insuficiente da situação, podendo comprometer o processo (Retchman e Bulhões 2004).

O avanço da globalização impulsionou essa necessidade de intercâmbio e flexibilidade diante de outras culturas. O gerente globalizado surge em cena como um novo personagem, que tem como premissa estabelecer relacionamentos com representantes de outras culturas, atuando neste sentido como uma espécie de embaixador do seu país perante seus interlocutores.

Afirmam Kerr e Inkson, que "o gerente globalizado de hoje e de amanhã precisa aprender a ser como Proteus¹ – flexível o bastante para se adaptar, com sabedoria e sensibilidade, a cada nova situação cultural" (2006:31). Existem forças econômicas, políticas, legais e culturais envolvidas num processo de negociação e é no preparo que reside o "xis" da questão, pois vestuário, comportamento, conhecimento e atuação são levados em consideração e o negociador precisa fazer com que a outra parte encontre pontos de vista compatíveis, a fim de que as tensões iniciais sejam minimizadas.

Faz-se necessário também que uma das maiores barreiras para a interação intercultural efetiva seja vencida, ou seja, não basear o comportamento em estereótipos, passando a imagem de que todos os membros de determinada cultura são idênticos (Thomas e Inkson, 2006).

Segundo Carvalhal e outros "muitos especialistas recomendam a abstenção de comentários de cunho pessoal sobre a outra parte e seu contexto cultural, região, país, mantendo-se uma atitude firme, mas afável, para evitar conflitos culturais ou de relacionamentos durante as negociações" (2006: 87).

Constata-se que é no desenvolvimento dessa habilidade de perceber o outro em seu contexto cultural, denominada Inteligência Cultural, que reside a chave para o sucesso em um processo de negociação, pois ela propicia a redução da probabilidade de se cometer gafes, além de evidenciar interesse pelo próximo facilitando os entendimentos.

É importante ressaltar que tal habilidade é um aprendizado constante, que necessita ser praticado e aprimorado sempre, pois somente a partir do momento que se percebe o outro como semelhante, apesar das diferenças culturais e respeita-se esse aspecto, é que se pode caminhar para um perfeito entendimento sem conflitos.

A Inteligência Cultural neste contexto representa importante habilidade na condução das relações humanas, tornando mais fácil o exercício diário – e difícil – de se conviver com as diferenças.


 
1-Proteus, personagem da mitologia grega. Era um deus do mar, que mudava sua figura à vontade, adaptando-se às mais diversas situações.



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1 Proteus, personagem da mitologia grega. Era um deus do mar, que mudava sua figura à vontade, adaptando-se às mais diversas situações.